O resultado da intervenção paisagística para a avenida que corta Curitiba – a BR 116 em Curitiba – é acima da média nacional. Ainda assim, está longe de ter tornado aquele espaço público agradável. Que tipo de qualificações as vias expressas no meio das cidades merecem?
Imagens do site da prefeitura.
A BR116 corta Curitiba e atravessa uma série de bairros de renda média e média-baixa. De certa forma, ela se opõe ao setor mais rico, a norte e noroeste e, ao longo dos anos, recebeu várias propostas de requalificação, todas com o objetivo de transformar a rodovia em uma via urbana, integrando-a à cidade. Buscava-se também ampliar a integração física entre os dois lados da rodovia.
Os Projetos BR-Vida (1993), BR-Cidade (1996) e Sistema de Transporte de Alta Capacidade (1999).
O projeto mais recente de requalificação da BR 116, e que foi implantado, envolveu uma operação urbana consorciada. Operação Urbana Consorciada é um instrumento legal previsto no Estatuto das Cidades e no Plano Diretor de Curitiba de 2004 que prevê a venda, pela prefeitura, de um direito adicional de construir. Este direito é alienado em Certificados de Potencial Adicional de Construção, também chamados cepacs. Os recursos financeiros oriundos de sua venda o município pode dispor para “melhorias urbanísticas estruturais, sociais e a valorização ambiental”. É uma forma de capturar recursos privados para obras públicas.
As cepacs fizeram fama na Operação Urbana Faria Lima, em São Paulo, nos anos 1990. Esta operação urbana foi um grande sucesso para dinamizar o mercado imobiliário. Os bairros paulistanos da Vila Olímpia e do Itaim ganharam edifícios corporativos e residenciais moderníssimos sobre suas ruas estreitas e calçadas modestas. Não é exagero dizer que são arranha-céus envidraçados sobre um arruamento de favela. No quesito desenho urbano, o que se tem hoje é péssimo.
Os recursos obtidos nesta negociação, a prefeitura investiu no prolongamento da avenida Faria Lima, em dois túneis no cruzamento desta com outras avenidas e, creio, na infraestrutura dessa região. Não havia espaços públicos qualificados para o lazer e para fruição senão os canteiros centrais da avenida e uma ciclovia que, na ocasião, não se conectava a nada. Em 2008, numa outra parceria com a iniciativa privada, foi implantado um parque público ali, o Parque do Povo, em terrenos envolvidos em um imbróglio jurídico que perdura em 2015.
A operação urbana com leilão de cepacs virou o sonho das municipalidades, que tem grande parte de suas verbas comprometidas com gastos fixos e limitada capacidade de investimento. E o modelo da Faria Lima foi adotado na Operação Urbana Água Espraiada, também em São Paulo, no Porto Maravilha, no Rio de Janeiro (que inicialmente previa apenas edifícios corporativos e depois incluiu os residenciais) e em outras, inclusive a operação consorciada de Curitiba, que recebeu o sugestivo nome Linha Verde.
Projeto para a Linha Verde
Em 2015, mesmo paisagisticamente tratada, a Linha Verde remete à Marginal Tietê ou ao início da Rodovia Raposo Tavares, em São Paulo, e a muitas outras semelhantes pelas cidades brasileiras, com seus grandes galpões que abrigam um comércio que gosta de espaço: concessionárias, lojas de móveis, de materiais de construção, grandes cadeias varejistas – Decathlon, Tok&Stok, C&C.
A prefeitura informou que, dos 99 milhões de reais de cepacs leiloadas, arrecadou 34,4. A impressão que se tem é que o adicional construtivo não seja cobiçado ali porque há muitos lotes grandes e, mesmo sem o adicional, os empreendimentos se viabilizam e ainda há bastante potencial a construir em outros bairros da cidade. Os desenhos do Instituto de Planejamento de Curitiba mostram edifícios sugerem edifícios residenciais e comerciais. É um horizonte mais plausível que instituições financeiras e multinacionais.
Mas ela é acima da média nacional porque recebeu, no centro, a via exclusiva do transporte público. Para os pedestres, o ambiente não é acolhedor e as distâncias são longas mas a existência das linhas do BRT permitem que seja possível chegar até lá de forma digna e que haja campus universitários e conjuntos habitacionais ao longo da via. Os pedestres também existem na Marginal Tietê e na Raposo Tavares paulistana, mas finge-se que são aventureiros clandestinos.
Em meio aos canteiros da BR116, foi também implantada uma ciclovia. Há quem reclame que o traçado é sinuoso e que isto alonga um trajeto que o ciclista faz para se deslocar de um ponto a outro, não necessariamente por passeio. Mas a ciclovia está lá. Resta acompanhar como a cidade se desenvolve ao longo da infraestrutura colocada.
Texto: Francine Sakata
Referências:
Apresentação da Prefeitura de Curitiba na Oficina Quapá-SEL, na UFPR, organizada pelo Prof. Alessandro Filla Rosanelli, em junho de 2015 (imagens não creditadas).
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