POR BIANCA ANTUNES FOTO MARCELO SCANDAROLI
Edição 258 - Setembro/2015
Tom Avermaete é professor de arquitetura na TU Delft, na Holanda. Com pesquisas na área de reativação do espaço público, assumiu em 2014 a cadeira de Métodos e análises na universidade. Seu objetivo, nos conta, é instigar os alunos a procurar respostas para os novos papeis do arquiteto - e as novas ferramentas e abordagens. Isso, claro, sem se esquecer da história: seus estudos examinam precedentes (métodos, instrumentos e atitudes de design) que tenham a ambição explícita de construir uma base crítica de conhecimento arquitetônico, e que possa influenciar o pensamento e a prática contemporâneos. Na busca por disseminar o conhecimento, Tom também faz parte do conselho editorial da Oase Architectural Journal e do Journal of Architectural Education (JAE) - onde busca investir em textos mais longos e aprofundados, analisando novas formas de publicar textos críticos e buscando diferentes lentes de análise.
Tom esteve em São Paulo em agosto para um evento organizado pelo Dutch Culture, com apoio da Escola da Cidade e da Biblioteca Mário de Andrade, chamado Re-Use. Com palestrantes brasileiros e holandeses, o evento propôs a discussão dos desafios encontrados na reutilização de edifícios e de espaços urbanos ociosos, com exemplos de projetos pelo mundo. Tom falou sobre espaços públicos e levantou experiências positivas vindas de pequenas intervenções. "Há muitas iniciativas interessantes, principalmente em projetos de pequena escala e colaborativos - são pequenas arquiteturas em locais pontuais, é diferente de pensar no grande bulevar ou na grande praça", nos conta nesta entrevista realizada logo após sua palestra.
A internet nos entrega muita informação, imagens e formas de fazer o tempo todo. De que maneira você analisa isso? É bom ou perigoso para os arquitetos?
Tem um lado muito bom: nunca tivemos acesso a tantas e múltiplas informações, que podemos cruzar de muitas maneiras. Dependíamos de imagens e análises que vinham das revistas. E hoje com blogs, sites especializados e tantas plataformas temos disponíveis análises com diferentes pontos de vista sobre o mesmo edifício. Isso eu acho incrível: o fato de podermos cruzar informações vindas de fontes diversas, de podermos ter acesso a olhares mais críticos, que podem vir do próprio arquiteto da obra, mas também dos moradores do edifício, do entorno ou de alguém que tenha se envolvido no processo político, por exemplo. Mas vejo, simultaneamente, e principalmente entre os estudantes, que não são muitos os que se esforçam para cruzar as informações. Percebo isso quando peço para estudarem um projeto específico. Muitos utilizam apenas uma fonte. O que normalmente fazem é ir ao Google - e eles acreditam que, se não encontrarem a informação nas cinco primeiras páginas, ela não existe.
Como vê a qualidade da informação publicada?
Estou analisando isso agora - sou também editor do Oase Architectural Journal. Lá percebemos que é muito importante saber qual é nosso papel nessa paisagem ampla. Hoje se absorve muita informação rápida, pequena, baseada em imagens. É difícil encontrar pesquisas mais profundas, parece que todas as informações têm um mesmo nível. Por isso, na revista, decidimos explicitamente escrever artigos e reportagens mais longos sobre os edifícios que publicamos. Já existem sites de informações rápidas sobre arquitetura que produzem informação limitada. Então, quem produz informação tem a responsabilidade de saber onde se posicionar, o papel que irá assumir e qual informação irá oferecer. De outra forma, vivenciaremos visões cada vez mais estreitas na crítica de arquitetura, que se tornaria muito superficial. Há necessidade de ultrapassar essa informação rápida que chega - e que acho importante também. E há outro ponto: precisamos de informações mais profundas de críticos, de arquitetos, de historiadores, de teóricos, mas também informações vindas das pessoas que moram nos edifícios, por exemplo. Esse é um dos desafios quando se cria a informação mais aprofundada: fazer com que seja também diversificada. De alguma forma, esse é um dos novos desafios.
O projeto De Ceuvel, em Amsterdã, foi organizado de forma colaborativa por arquitetos, artistas, designers e empreendedores da indústria criativa para transformar um terreno poluído em um oásis urbano, a partir de práticas sustentáveis de construção e manutenção. O terreno poluído passa por um processo de regeneração com plantas que limpam o solo. Elevados do terreno, foram locados passarelas de bambu e espaços de lazer e de trabalho construídos a partir de barcos não mais utilizados. O terreno foi cedido pela prefeitura por dez anos - um exemplo de trabalho colaborativo em um espaço pontual da cidade, que dinamiza uma área antes pouco visitada. O projeto urbanístico é do Space & Matter
Você vê espaço para esse tipo de conteúdo?
Vivemos em um mundo em que a informação rápida é muito importante. Isso é bom porque estamos bem informados e se pode reagir rapidamente às informações. Sabemos imediatamente o que está acontecendo em nossas cidades. Mas acho que as pessoas irão se dar conta - não sei se muitas já se deram - de que há necessidade para análises mais profundas e mais diversas. Sinto, novamente trabalhando com estudantes, que discutimos projetos de arquitetura e projetos urbanos, de maneiras às vezes muito superficiais. Como um exercício, comparamos no Oase artigos escritos com lentes historiográficas, como maneiras de olhar a arquitetura, e outros com lentes práticas e contemporâneas. Encontramos discrepâncias interessantes. Nas análises historiográficas há lentes complexas, e quando olhamos para como fazemos isso hoje, na maioria das vezes é superficial. Discutimos sobre o conceito geral, sobre materiais, mas há muitos outros aspectos e camadas que devem ser pensados e que fazem ir a um nível mais profundo.
Como você vê a prática atual da arquitetura?
Há muitas iniciativas interessantes, principalmente em projetos de pequena escala e colaborativos no espaço comum - falo de pequenas arquiteturas, ou seja, de um espaço público que não é o grande bulevar ou a grande praça. Estamos vivendo uma época de muita energia. As coisas estão se movendo e ainda temos que entender esses novos desenvolvimentos: os projetos de pequena escala, colaborativos, com atores diversos e como eles se relacionam com o expertise que temos no nosso campo de trabalho. Nós, arquitetos, temos uma longa tradição e história, que inclui questões como materialidade, composição, tipologias, luz. E nesses novos projetos ainda falta uma conexão com essa longa história e esse expertise que temos em nosso campo. Estou esperando que alguma dessas novas práticas diga: ok, trabalhamos com esses diferentes atores para desenhar o espaço público, mas também temos conceitos sobre a materialidade desses espaços, a durabilidade, sobre novas tipologias... Mesmo que seja um campo muito vibrante, sinto que ainda não se conecta com a história e o expertise que temos.
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