A Política do Coitadinho

O processo de amadurecimento da gestão pública de uma cidade é lento e contínuo. Quando Palmas foi fundada, estávamos na era do “paternalismo enlouquecido”. O estado se submetia a suprir todas as necessidades dos cidadãos, e além das suas obrigações constitucionais, provia emprego, alojamento, transporte particular, alimentação... Não era necessário um motivo. Neste mesmo período, muitas pessoas de todo o Brasil se mudaram para a nova capital. No centro projetado de Palmas foram abertas as quadras ARSE 14 e ARSE 21 para aqueles que possuíam melhores condições financeiras, e a ARSE 51 e ARSE 72, para funcionários públicos e outros, mesmo com a recomendação do Grupo Quatro de ocupar as quadras da capital de forma ordenada, partindo da Avenida JK para a periferia. As quadras comerciais da área central começaram a ser licitadas, assim como algumas ARSEs e ARNEs. Porém, o modelo de licitação era o de maior valor ofertado, e os menos favorecidos tinham que morar em algum lugar, mesmo sem condições de comprar um lote. Assim, nasceram a Vila União, o Setor Taquaralto e os Jardins Aureny. Na época, beirava a insanidade falar em remover as famílias ali instaladas para quadras regulares no Plano Diretor.
O tempo passou, e hoje estamos num período que eu gosto de chamar de “paternalismo moderado”. Os gestores públicos atuais atuam em um lastro existente entre o “correto” e o “politicamente vantajoso”.Porém, deve haver motivo. Ainda preferem propor o aumento no perímetro urbano da capital, mesmo contra a vontade da maioria da população, justificando que a regularização dos tais 44 loteamentos ilegais resolveria o problema fundiário, viabilizando assim a cobrança de IPTU. Creio, porém, que a razão principal desta proposta seja o lobby de alguns proprietários de terra na zona rural.
Para piorar, estão colocando situações completamente diferentes como se fossem iguais. O loteamento irregular denominado Lago Norte, por exemplo, já é uma dura realidade. A Gestão Municipal tem por dever dar uma solução àquelas famílias. Não estou aqui defendendo o aumento do perímetro urbano, nem mesmo a regularização do loteamento, mas acho que a prefeitura deve abrir um leque maior de opções devido à gravidade do problema e ao número de famílias que já moram ali. Entretanto, a situação dos loteamentos irregulares que se encontram a leste da rodovia é completamente diferente. Não há praticamente nenhum proprietário morando ali. É uma nova modalidade de especulação imobiliária. Beira o ridículo... Pessoas que, pretensamente,querem sair da cidade para a área rural, e com todo aquele espaço, optam por investir em condomínio fechado.Depois, fazem pressão para que o perímetro urbano chegue até lá. A quem isto beneficia?
O Lago Norte é o primo pobre, o problema social, e a assistência aos seus moradores é a bandeira erguida. Contudo, quem está balançando essa bandeira são os proprietários de terras na margem leste da rodovia.Essa é a “Política do Coitadinho”, que parte de premissas verdadeiras para chegar a conclusões duvidosas. Coitadinhos, aliás, fiquem atentos. Etimologicamente,“coitadinho” tem origem na palavra “coito”... Ao contrário do que se possa pensar, quem está sendo prejudicado em toda esta novela é a população palmense, principalmente os moradores das quadras aprovadas que ainda não foram asfaltadas. Estes sofrem coma lama e a poeira.

Giordane

Giordane Martins Silva é Arquiteto e Urbanista, especialista em Planejamento Urbano e Ambiental pela UFT.
e-mail: giordanems@pop.com.br

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