Sintaxe Espacial

Criada por Bill Hillier e seus colaboradores da Universidade de Londres, no começo da década de oitenta, a Teoria da Sintaxe Espacial busca descrever a configuração do traçado e as relações entre espaço público e privado através de medidas quantitativas, as quais permitem entender aspectos importantes do sistema urbano, tais como a acessibilidade e a distribuição de usos do solo.

Desde que foi criada, a análise sintática foi aplicada nos mais diversos lugares do mundo, obtendo resultados positivos quanto às análises realizadas e às correlações obtidas. Esses resultados aplicaram-se a situações bastante diversas, tais como Londres, Atenas e algumas cidades islâmicas. No Brasil, o método já foi aplicado em Porto Alegre, Recife, São José (SC) e em Brasília e nas suas cidades-satélites, entre outros lugares.

CONCEITOS BÁSICOS DA SINTAXE ESPACIAL

Linhas axiais

Linhas axiais são as maiores linhas retas capazes de cobrir todo o sistema de espaços abertos de um determinado recorte urbano (HILLIER; HANSON, 1984). Juntamente com os espaços convexos, elas são a unidade básica de análise utilizada pela Sintaxe Espacial. Os espaços convexos, entretanto, não têm sido tão frequentemente utilizados, talvez por despenderem maior quantidade de esforços para serem confeccionados.

Integração

sintaxe_08Das medidas possíveis de análise sintática, a principal é a chamada “Integração”. Ela é útil na previsão de fluxos de pedestres e veículos e no entendimento da lógica de localização de usos urbanos e dos encontros sociais. A medida de integração mede o quão “profunda”, ou distante, uma linha axial está de todas as outras linhas do sistema (HILLIER et al, 1993).

O conceito de profundo leva em consideração a distância topológica, e não a distância métrica. Sendo assim, todos os eixos diretamente conectados a uma determinada linha estão a um passo topológico dela. As linhas diretamente conectadas a esses eixos estão a dois passos topológicos da primeira, e assim por diante. A profundidade média de uma linha axial (MD) é, portanto, obtida pela somatória das profundidades de todas as linhas axiais em relação a ela, dividida pelo número total de linhas menos um:

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Onde:

MDi = Profundidade média do espaço i;
dij = Profundidade da linha j em relação à linha i;
k = Número total de espaços do sistema.

 

Mais importante que entender a fórmula, entretanto, é entender a lógica do cálculo da medida de integração. Ela define que linhas axiais mais “rasas”, isto é, mais próximas das outras linhas do sistema, são consideradas linhas maisintegradas. Por outro lado, aquelas linhas mais “profundas”, ou seja, mais distantes das outras linhas do sistema, são consideradas segregadas. A partir da profundidade média é calculada a integração de cada linha axial, De acordo com Hillier e Hanson (1984), linhas axiais com valores de integração superior a 1,67 podem ser consideradas altamente integradas, enquanto que aquelas com valor inferior a 1 podem ser consideradas como segregadas.

Núcleo integrador

Corresponde às linhas mais integradas do sistema. Dependendo do número total de linhas, pode ser 50%, 25%, 10% ou até mesmo uma porcentagem menor de linhas, em casos de sistemas muito grandes. Conforme Hillier e Hanson (1984, p.115), é sempre interessante ver onde estão as linhas mais integradas e como elas se relacionam no sistema; mas mais importante é que tipo de padrão é formado pelos espaços mais integrados (é uma estrutura em árvore? ou em grelha? abrange toda a cidade ou apenas uma parte dela? e assim por diante).

Movimento Natural

O Movimento Natural pode ser entendido como a parcela do movimento total de pedestres em uma rede de espaços públicos determinada apenas pela sua estrutura configuracional, independente da presença ou não de atratores (HILLIER, 1996). Ou seja, o movimento natural é o movimento de pessoas que é determinado apenas pela configuração das ruas e praças, pela forma como as ruas estão conectadas ou não, se possuem continuidade, se realizam ligações importantes entre pontos da cidade, e assim por diante. Hillier et al (1993) argumentam que a configuração do traçado, por si só, já gera um padrão de movimentação pela cidade, e esse padrão é o principal definidor de outros elementos do sistema urbano, como por exemplo o uso do solo.

Aprofundando esse ponto, Hillier et al (1993) indica que os usos urbanos são posteriores à configuração, e que atuam como multiplicadores dos padrões de movimento natural. Portanto, a quantidade de pedestres em áreas comerciais é o produto da combinação entre a estrutura configuracional e a atração exercida pelas atividades exercidas nas edificações (comércio, residência, indústrias, etc.). Em outras palavras, isso equivale a dizer que os usos comerciais (para dar um exemplo) tendem a instalar-se em espaços com alta integração, pois esses espaços possuem já um movimento (natural) de pessoas. Ao instalar-se, eles passam a atrair ainda mais pessoas, aumentando exponencialmente a quantidade original trazida pela configuração.

Isso serve para desmascarar uma falácia muito comum nos projetos de urbanismo, que é a de querer colocar comércio em determinadas áreas “para atrair movimento”. O comércio, por si só, não atrai movimento, apenas quando está localizado em áreas que naturalmente concentram maior número de pessoas. Tentar prever usos comerciais em áreas segregadas, que não têm a vocação para atrair pessoas, não dará certo.

Conectividade

Conectividade de uma linha axial é a quantidade de linhas que a interceptam, ou seja, a quantidade de linhas que estão a uma profundidade igual a 1 a partir dessa linha. Essa medida é interessante para dar uma visão mais clara do papel que uma linha axial desempenha dentro do sistema. Linhas com alta conectividade tendem a ter um papel importante, uma vez que potencialmente promovem acesso a um grande número de outras linhas axiais.

Integração local

A integração local, ou de raio limitado, é calculada da mesma maneira que a integração global, com a diferença que a profundidade média é obtida apenas para as linhas localizadas dentro de um determinado limite de passos topológicos. Assim, ela é adequada para análises de centralidades locais, ou seja, para identificar aquelas áreas com potencial para funcionar como estruturadoras de centralidades de bairros.

APLICAÇÕES DA SINTAXE ESPACIAL

A Sintaxe Espacial pode ser aplicada em diversos estudos no meio urbano, entre eles:

  • acessibilidade;
  • coesão e exclusão social
  • segurança;
  • áreas comerciais.

O site oficial da vertente comercial da Sintaxe Espacial mostra vários exemplos da utilização da Sintaxe em estudos urbanos. Um deles é em Brixton, onde foi feito um estudo para revitalizar uma área central. A Sintaxe mostrou que a área dependia excessivamente de uma rota principal, mantendo outras áreas segregadas, o que impedia o comércio de se instalar. A partir dissso, foram propostas outras conexões para o tecido urbano, de forma a criar novas localizações de interesse para o comércio local.

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Situação antes do estudo | Situação proposta a partir do estudo.

No Brasil, um exemplo da utilização da Sintaxe Espacial foi a leitura técnica realizada para o Plano Diretor de São José – SC. A análise mostrou que o município é altamente segregado, confirmando as reclamações dos moradores ouvidos nos eventos de leitura comunitária. A análise, entretanto, possibilitou um entendimento mais aprimorad dessa segregação, e deu pistas importantes de como superá-la. O mapa da integração global e o mapa destacando as linhas mais integradas e as mais segregadas mostram claramente a grande diferenciação entre as partes da cidade.

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Os gráficos abaixo mostram de maneira ainda mais clara a diferença entre os bairros mais segregados e os mais integrados:

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Os bairros situados a oeste são aqueles com menor integração global, o que significa que estão mais distantes dos outros bairros, se analisado o sistema urbano como um todo. Esses bairros podem, portanto, ser considerados segregados com relação à cidade, que traz prejuízos não apenas em termos de deslocamentos (que tendem a ser consideravelmente maiores), mas também cria dificuldades às possibilidades de interação social com os outros bairros da cidade.

Como conclusões, foi possível prever uma estruturação do sistema viário cujos principais objetivos foram promover a integração entre os bairros e aumentar a integração daqueles mais segregados atualmente, através de vias arteriais que estabelecessem uma estruturação para a área.

Em tempo: o livro “Space is the Machine“, de Bill Hillier, está disponível em pdf. Vale o download, já que o livro é uma referência importante para a teoria da Sintaxe Espacial, aprofundando os conceitos e metodologias explorados no “Social Logic of Space”.

Referências bibliográficas:

HILLIER, Bill; HANSON, Julienne. The social logic of space. Cambridge: Cambridge University Press, 1984.

HILLIER, Bill; PENN, A.; HANSON; GRAJEWSKI, T.; XU, J. Natural movement: or, configuration and attraction in urban pedestrian movement. Environment and Planning B, v. 20, p. 29-66, 1993.

HILLIER, Bill. Space is the machine. Cambridge: Cambridge University Press, 1996.

Fonte: http://urbanidades.arq.br/2007/09/sintaxe-espacial/

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