Como especificar áreas comuns escolares

Por Juliana Nakamura

Edição 236 - Novembro/2013

Espaços de recreação e vivência em instituições de ensino podem favorecer o aprendizado. O desafio na concepção dessas áreas é gerar ambientes agradáveis e estimulantes, com recursos e terrenos cada vez mais exíguos

Embora sejam estratégicas para estimular o convívio, o lazer e o aprendizado, as áreas escolares de uso coletivo - pátios, playgrounds, jardins e quadras esportivas - são, na maioria das vezes, relegadas a segundo plano. Salvo raras exceções, as áreas livres e de recreação são concebidas como espaços residuais. Os pátios são tratados como meros locais de respiro para o intervalo entre as aulas, em vez de assumir um papel pedagógico mais relevante, em complementação ao aprendizado que acontece na sala de aula.

"O problema é que pátios e espaços livres não são planejados em grande parte das escolas. Faz- -se o projeto e procura-se atender a um programa preestabelecido, inserindo uma quadra de esportes ou um playground", lamenta o arquiteto Silvio Soares Macedo, professor da FAUUSP. "Os espaços são concebidos sempre com uma função. Pouco se faz no sentido de criar áreas simplesmente para brincar", continua Silvio.

Foto: Carlos Kipnis

Em projetos de escolas, o planejamento dos ambientes deve estar conectado com a proposta pedagógica da instituição, e o ideal é que também haja consonância com os desejos da comunidade. Para a escola estadual Jardim Tatiana, em Votorantim, SP, o Grupo SP seguiu as diretrizes da Fundação para Desenvolvimento do Ensino do Estado de São Paulo (FDE) e também deixou a quadra de esportes aberta aos fins de semana à população

E os estudantes precisam desses espaços. Afinal, não somente as salas de aulas, mas também os pátios, refeitórios, circulações, jardins e áreas ao ar livre influenciam o desempenho de alunos e professores. Mais do que uma questão de conforto, a oferta de ambientes acolhedores e agradáveis faz com que os usuários estabeleçam uma relação de pertencimento e de afetividade com a escola.

Na prática, os programas arquitetônicos escolares limitam a área de recreação às quadras poliesportivas, aos pátios cobertos próximos ao refeitório e, quando há educação infantil, a playgrounds muito semelhantes aos encontrados em praças públicas. "Estabelecem-se como prioridade o atendimento às normas de acessibilidade, rotas de fuga, além de regras específicas de cada região, determinando revestimentos, dimensões e vãos livres", resume a arquiteta Paula Roberta Pizarro Pereira, pesquisadora do grupo da professora Doris Kowaltowski na Unicamp.

COMO DEVERIA SER
O arquiteto que se dedica à concepção de áreas de lazer em estabelecimentos de ensino precisa superar alguns desafios. A começar pela restrição orçamentária, comum tanto em instituições públicas quanto privadas. Também é preciso compatibilizar programas arquitetônicos extensos em terrenos exíguos, muitas vezes com topografias acidentadas e restrições ambientais. Para essas situações, uma solução recorrente é alocar as quadras esportivas em pavimentos superiores às salas de aula, prevendo mecanismos de isolamento acústico. Paula complementa que "a dinâmica da área da educação exige que os espaços escolares tenham atenção continuada. O projeto deve ser flexível". Ou seja, ao longo dos anos, a arquitetura deve considerar as necessidades pedagógicas para possíveis mudanças, e fornecer condições para adaptar o uso.

O ideal, como defende a professora Dóris Kowaltowski em seu livro Arquitetura escolar - O projeto do ambiente de ensino, seria que o planejamento dos ambientes estivesse conectado com a proposta pedagógica da instituição. Seria desejável que o projeto contemplasse, antes de sua elaboração, um processo analítico e participativo com a comunidade, formando uma discussão consistente que estimulasse o projetista a fazer inserções específicas para as necessidades da escola. "Hoje, o que ocorre nas atividades curriculares e com os métodos pedagógicos aplicados está fora do domínio dos arquitetos que projetam as escolas", acrescenta Paula, lembrando que, cada vez mais, atividades curriculares com disciplinas integradas acontecem sem o suporte adequado dos espaços escolares.

Nesse sentido, uma ação positiva é a adição de espaços livres no corpo do edifício, estreitando a relação entre interior e exterior. É o caso das salas de aula que dão acesso a jardim ou horta, oferecendo suporte ao ensino de ciências e de matemática.

CONFORTO E SEGURANÇA
Sejam anexas às salas de aula, sejam concebidas como grandes pátios, as áreas livres escolares precisam ser democráticas para atender alunos de diferentes idades. "Elas devem contar com um piso adequado para as crianças brincarem e correrem, ter uma parte sombreada e possuir equipamentos resistentes, que exijam pouca manutenção", lista Silvio Macedo. O paisagismo, segundo ele, pode tornar o local mais agradável, mas precisa ser bem planejado. Do contrário, pode gerar mais problemas do que benefícios, como um sombreamento excessivo em áreas que precisam de transparência e claridade.

Em relação ao piso, é importante identificar os possíveis usos e usuários do local. Para playgrounds, é importante que o material garanta segurança química, resistência à abrasão, durabilidade, praticidade, resistência à derrapagem e baixa necessidade de manutenção, além de proporcionar algum efeito lúdico. Pisos de borracha, bancos de areia com no mínimo 30 cm de altura e grama podem ser utilizados. Com relação aos equipamentos, é fundamental apoiar a especificação em normas técnicas brasileiras e, na ausência destas, normas estrangeiras. Os playgrounds, por exemplo, devem atender aos requisitos da NBR 14.350.

Assim como a especificação dos materiais, o dimensionamento de áreas livres deve levar em conta a faixa etária e a quantidade de usuários. Na primeira infância, as crianças precisam de espaços bem delimitados. As crianças mais velhas, por sua vez, demandam ambientes mais abertos para estimular sua exploração e seu desenvolvimento. Já os adolescentes necessitam de áreas e equipamentos que favoreçam a interação e a conversa.

Os projetos de áreas comuns escolares também não podem prescindir de condições termoacústicas adequadas. Uma estratégia para contemplar isso é utilizar orientações solares adequadas e sombreamentos sobre equipamentos de convivência, como bancos.

Impactam diretamente as condições de conforto a organização das salas de aula e a circulação primária. No Brasil, a tipologia que mais se destaca é a "fordiana", com salas distribuídas linearmente em torno de um corredor central. Paula Pizarro ressalta as deficiências desse modelo, como a pouca oportunidade de criação de espaços de aprendizado em corredores, grande fluxo de alunos em relação aos espaços de circulação e rotas de alunos que se cruzam. Há, também, problemas de conforto ambiental, principalmente os corredores sem abertura lateral ou zenital que impedem a ventilação cruzada.

A pesquisadora da Unicamp explica que os projetos tidos como referência atualmente tendem a explorar a tipologia em E, mais conhecida como espinha de peixe. Nela, os serviços básicos da escola são organizados em um corredor central e as salas de aula são arranjadas em agrupamentos, com um espaço comum entre elas. Esse espaço comum tem ligação direta com área livre externa e pode ser coberto ou descoberto.

"Em regiões quentes recomenda-se que os espaços comuns não tenham cobertura e apresentem elementos que possam proporcionar resfriamento passivo e sombreamento, como pérgulas e vegetação", finaliza Paula.

NORMAS E REFERÊNCIAS

- ABNT NBR 9050 - Acessibilidade e circulações
- ABNT NBR 14.350 - Segurança de brinquedos de playground
- DIN V 18032 / 2 - Dispõe sobre salas esportivas, salas para ginástica, jogos e múltiplas utilizações, local para atividades desportivas e ensaios
- EN 14904/2006 - Aborda pavimentos desportivos
- ABNT NBR 14050:1998 - Sistemas de revestimentos de alto desempenho, à base de resinas epoxídicas e agregados minerais - Projeto, execução e avaliação do desempenho
- Cadernos Técnicos: Subsídios para a Elaboração de Projetos e Adequação de Edificações Escolares, do Ministério da Educação (MEC

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