Protagonista no modernismo e brutalismo, o concreto aparente ganha novas aplicações em projetos residenciais

Por Juliana Nakamura
Edição 239 - Fevereiro/2014
Foto: Eduardo Eckenfel


Seja concreto industrializado ou concreto virado em obra, como a casa projetada pelos Arquitetos Associados em Belo Horizonte, a fôrma utilizada para modelar o material é determinante no acabamento. Aqui, a fôrma de madeira plastificada deu acabamento liso
Expressivo, resistente e com múltiplas possibilidades de uso, o concreto aparente é uma solução construtiva de forte identificação com a arquitetura brasileira. Parte importante dos movimentos modernista e brutalista, o material estrutural foi largamente explorado em fachadas, brises, paredes internas, escadas e mobiliário, por arquitetos como Oscar Niemeyer, Vilanova Artigas, Ruy Ohtake e Paulo Mendes da Rocha.
Os anos se passaram e o concreto aparente ainda mantém espaço em projetos residenciais. Explicações para isso vão desde a estética contemporânea e original - cada estrutura moldada com o material é única, resultado do traço, processo de cura e desenforma - à possibilidade de dispensar revestimentos e reduzir custos com manutenção. Uma vez curado e desenformado, o material recebe apenas um tratamento impermeabilizante superficial.

Com aplicações em ambientes internos e em áreas externas, o concreto aparente pode ser empregado como sistema construtivo para toda a edificação ou simplesmente compor um detalhe arquitetônico. Além disso, ele se integra a diversas linguagens, sobretudo às que exploram a precisão e o minimalismo. "Ainda não encontrei uma limitação para este produto, que tenho aplicado na minha própria casa há anos, com qualidade inalterada", afirma o arquiteto Guilherme Torres. "Em projetos residenciais, a especificação desse material depende muito do repertório do cliente", acrescenta o arquiteto Gustavo Calazans, que associa a sua predileção pessoal pelo material à herança modernista e acadêmica da FAUUSP, onde se formou.
MISTURA CERTA
O concreto aparente é aquele obtido pela mistura de cimento, agregados, água e, em alguns casos, aditivos químicos, mas que não recebe revestimento com pasta ou argamassa em sua superfície. Como também tem a função de acabamento, exige cuidados especiais em sua execução para assegurar a aparência final desejada. "A especialização da mão de obra para trabalhar com esse material é fundamental, ou o resultado pode ser desastroso", alerta Calazans. Esse é um dos maiores desafios, pois a uniformidade do produto final depende diretamente da qualidade dos processos que envolvem sua execução, bem como da homogeneidade do acabamento e dos componentes utilizados. "O concreto aparente não admite erros e muitos retoques. Se por algum motivo uma grande área foi comprometida, a solução é derrubar tudo e começar de novo", afirma Gustavo Calazans.
A granulometria dos agregados, por exemplo, deve ser contínua e recomenda-se que o cimento tenha a mesma procedência do início ao término da obra, para evitar diferenças de tonalidade muito drásticas. Os aditivos, quando usados, são basicamente plastificantes e superplastificantes, que permitem reduzir a quantidade de água na mistura sem alterar o teor de cimento. Ou seja, aumentam a resistência da estrutura, diminuindo sensivelmente a porosidade e a retração hidráulica.
Para colori-los, podem ser adicionados ao concreto pigmentos resistentes à alcalinidade do cimento e à exposição dos raios solares. Esse recurso, contudo, ainda é pouco aproveitado no Brasil por causa do custo. Os pigmentos mais comuns são os óxidos de ferro, que fornecem tonalidades amarela, vermelha e amarronzada. Também existe o óxido de cobalto, com tonalidade azul.
Há, ainda, o recente concreto branco, produzido com cimento branco e aditivos e que requer elevado controle tecnológico, além de alto investimento. Arquitetos como Santiago Calatrava, Richard Meyer e Álvaro Siza têm utilizado esse material com finalidade estética e sustentável, já que o concreto branco reduz o consumo energético dos edifícios pelo alto nível de refletância e pela redução da condutividade térmica - um exemplo emblemático do uso do material é o Museu Iberê Camargo, de Álvaro Siza, em Porto Alegre.
MOLDES E ACABAMENTOS
As fôrmas a serem utilizadas são determinantes para garantir o resultado desejável do concreto aparente. Em contato direto com o material, são o que define a aparência que a superfície terá. As mais utilizadas, em função do custo, são as de compensado de madeira (madeirite rosa), que deixam algumas marcas nas placas, e as de compensado plastificado (madeirite preto), que proporcionam um acabamento mais uniforme. Em ambos os casos, o sistema de travamento da fôrma pode gerar furos na superfície dos quais a arquitetura pode, eventualmente, tirar proveito. A forma metálica, mais cara, é opção para quem busca um aspecto extremamente liso.
Utilizar o concreto com superfície texturizada também é possível, e cada vez mais comum em projetos residenciais. Uma das estratégias empregadas é usar sarrafos de madeira na função de fôrmas. "Esse tipo de solução é mais cara e trabalhosa, porque exige uma fôrma dupla, com o ripado de madeira na face em contato com o concreto e madeirite plastificado no lado de fora, garantindo o perfeito travamento", explica Gustavo Calazans.
Tratamentos superficiais, como o jateamento de água em alta pressão sobre superfície de concreto em estado fresco ou a aspersão de solução de ácido clorídrico sobre o concreto endurecido e úmido podem resultar em um material texturizado. É possível, ainda, recorrer a acabamentos manuais, como polimento e apicoamento para gerar ranhuras. Em todos os casos, é recomendada a utilização de painéis de amostra antes da aplicação dos procedimentos em larga escala, para que sejam ensaiadas as texturas que se deseja obter.
Para o engenheiro Thomas Garcia Carmona, diretor da Associação Brasileira de Engenharia e Consultoria Estrutural (Abece) e da Exata Engenharia, não há limites técnicos para uso do concreto aparente. Mas o sucesso ou fracasso da execução depende de alguns cuidados, a começar pelo projeto de arquitetura, que deve considerar as condições de exposição do material a agentes agressivos. Como estratégias importantes, cita detalhes de projeto que modificam o fluxo da água da chuva e evitam acumulação de água sobre a superfície do concreto - como chapins nos topos de platibandas e paredes, pingadeiras nos beirais etc.

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Fonte: http://au.pini.com.br/arquitetura-urbanismo/239/protagonista-no-modernismo-e-brutalismo-o-concreto-aparente-ganha-novas-305310-1.aspx

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