Pelo fim do “urbanês” para um planejamento urbano inclusivo

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Este texto escrevi em 2013, para o blog Chuva Ácida, e quero reproduzir aqui neste espaço. Apesar de escrever para o contexto de minha cidade, Joinville, ele se aplica para qualquer outra no Brasil. Nós que trabalhamos ou estudamos o planejamento urbano precisamos tornar a linguagem acessível, para que o máximo de pessoas possam entender e participar democraticamente do destino de suas cidades. A tarefa é longa, mas valiosa.
Há alguns anos a escritora indiana Gayatri Spivak lançou uma pergunta no mundo da Antropologia que ecoou longe: “pode o subalterno falar?”. O sujeito subalterno na definição de Spivak é aquele pertencente às camadas mais baixas da sociedade constituídas pelos modos específicos de exclusão dos mercados, da representação política e legal,e da possibilidade de se tornarem membros plenos no estrato social dominante. Em Joinville, como em qualquer outra cidade, convivemos com (e até mesmo somos) subalternos urbanos, pois somos reféns de um modelo de urbanismo imposto,conforme já relatei em outra oportunidade.
Após a regulamentação do Estatuto da Cidade em 2001, e de nosso Plano Diretor em 2008, os preceitos democráticos no planejamento urbano devem ser assegurados em qualquer ação estatal. Nesta lógica, todos possuem a oportunidade de participar, expressarem suas ideias e dialogarem. Afinal, planejar a cidade é lidar diretamente com a vida das pessoas. Infelizmente, alguns agentes (travestidos de grupos sociais de origem econômica) entendem de forma totalmente diferente.
Estas pessoas defendem que o planejamento urbano deve atender às demandas de mercado, aquelas que representam a vontade de um sistema que gera subalternos urbanos. Forma cidadãos que, por muitas vezes, não possuem o mínimo de dignidade para sobreviver. Não “aparecem”. Moram na longínqua periferia. Tornam-se impessoais na coletividade. Respondem a regras anônimas de submissão ao trabalho. Não têm acesso a um adequado sistema educacional. Não “entendem” de planejamento urbano – e nunca entenderão, se a lógica dominante-dominado persistir.
Estes agentes sociais trabalham nos bastidores para a “tecnização” das discussões relativas ao planejamento urbano. O poder de dizer o que é melhor para a cidade não é mais do subalterno, mas sim do técnico, que é o responsável pela organização do processo. Este técnico, por sua vez, raramente é orientado a dar a oportunidade de falar a aquele que será o principal atingido. O processo democrático, de natureza inclusiva, é excludente: poucos participam da tomada de decisões e são representados “democraticamente” por aqueles dominantes interessados em articular os interesses de outros representados, os oriundos de setores extremamente segregadores e maléficos para as cidades como um todo (indústrias com necessidade de expansão, imobiliárias, construtoras, incorporadoras, loteadores, etc.).
Por isso, se o planejamento urbano é feito para as pessoas, pois elas que habitam a cidade, é para elas que as discussões devem se dirigir. Por mais que a maioria subalterna não entenda de termos técnicos ou mapas setoriais multicoloridos, ela pode falar e deve ser orientada didaticamente a tal situação. Sem mapas setoriais. Sem segredos. Sem siglas. Sem “urbanês”. O movimento contrário a isto carateriza-se apenas por um motivo: esvaziar o principal espaço de mudança social, que é caracterizado pela participação popular de base e garantido por lei, o qual deveria combater interesses econômicos que, quase sempre, vão contra à cidade ideal e à cidade que todos queremos.

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