Mario Biselli

30/11/2011 | Revista Construção Metálica - Ed. 104/2011

Nascido em 1961 na capital paulista, Mario Biselli cursou a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Mackenzie de São Paulo, onde se formou em 1985. Em 2000, titulou-se como Mestre em Arquitetura e Urbanismo na mesma instituição. Acreditando na boa prática da arquitetura permeada pela reflexão acadêmica, em 1992, iniciou sua carreira como professor do Departamento de Projeto da Faculdade de Belas Artes de São Paulo. E desde de 1999 integra o corpo de professores do Departamento de Projeto na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Mackenzie. Junto com Artur Katchborian, em 1987, fundou o escritório Biselli + Katchborian Arquitetos Associados. Procurando compreender e responder às transformações econômicas e culturais brasileiras com sua arquitetura, Mario Biselli e Artur Katchborian tem projetado em todas as escalas e temas, desde um sem número de residências, edifícios públicos e privados, residenciais, comerciais e de serviços, edifícios de interesse social como escolas, centros esportivos e templos religiosos, a projetos de escala urbana, tanto através de clientes privados como de concursos públicos, em que obtiveram premiações de destaque. O escritório foi selecionado para representar o Brasil na 12ª Bienal Internacional de Arquitetura de Veneza, Itália, apresentando na bienal o Aeroporto de Florianópolis, o Teatro de Natal e o Centro Municipal de Arte e Educação dos Pimentas – CEU Pimentas, em Guarulhos.

Mario Biselli

Como foi a experiência de expor na 12ª Bienal Internacional de Arquitetura de Veneza?

Mario Biselli – Veneza foi um enorme orgulho para nós, por sermos escolhidos para representar o Brasil. E a própria curadoria escolheu três projetos: o Aeroporto de Florianópolis (detalhes na pág. 20), o Teatro de Natal (detalhes na pág. 24) e o CEU Pimentas, em Guarulhos. O CEU Pimentas foi uma ideia que nós tivemos para um concurso em 1996. Tem uma cobertura metálica que abriga uma praça com 230 metros. O programa previa biblioteca, sala de aula e sala de teatro. Estes blocos funcionais são construídos de concreto e alvenaria. A estrutura metálica da cobertura não se une fisicamente aos outros materiais. Ficou independente dos blocos. A articulação ficou perfeita, sem conflito de linguagens.

Qual foi a sua primeira obra realizada em estrutura metálica, ou as primeiras, e como foi esse processo?

Mario Biselli – Sempre gostei do aço. É uma grande arte trabalhar com ele. A primeira vez que usei mais extensamente este material foi justamente no prédio de Curitiba. E logo depois fizemos o Ginásio de Barueri. Foram obras nas quais eu já tinha maturidade para usar o aço. Eu conhecia bem este material que permite muita interatividade do arquiteto com a obra. Acho que é por isso que eu gosto de trabalhar com ele. O aço é especial para uma série de questões, grandes vãos, velocidade de execução, limpeza, sustentabilidade etc. No caso do Ginásio de Barueri, o vão foi decisivo para escolha da técnica construtiva. Lá era preciso construir um vão de 100 metros. E se fosse para fazer isso em concreto, nem saberia por onde começar, porque o vão era muito grande. Sabemos que o aço resolve este tipo de coisa com muita facilidade. Na época chamei os calculistas Julio Fruchtengarten e Zaven Kurkdjian, que me ajudaram a desenhar a estrutura. Dali saiu um desenho muito interessante. O primeiro caso, era um diálogo bem arquitetônico. E o segundo, um problema muito objetivo de grandes vãos. Um vão livre de 100 metros que, com aço, ficou facílimo de ser resolvido. E é uma estrutura muito leve. Se fosse em concreto, se transformaria numa estrutura muito pesada. O concreto vai bem à compressão. E o aço é indiferente quanto a isso.

Como foi desenvolvido o projeto do novo Terminal de Cumbica?

Mario Biselli – A decisão de usar integralmente o aço foi para envolver a indústria na execução desta obra, transformada em montagem, e não em obra civil. Ao se fazer a opção pela metálica, isso tornou a obra um outro tipo de artefato onde tudo é mecânico, com parafuso, solda, são todas peças limpas, com uma precisão diferenciada e milimétrica. Toda vez que utilizo o pré-moldado em concreto devo me esforçar pelo acabamento, sempre acho que ficou mal acabado. Com aço não tem este problema. As alvenarias das paredes poderiam ser todas em drywall, que é um sistema muito rápido. Pelo briefing da Infraero, esta obra deveria sair o mais rápido possível. Então partimos para a metálica, que é uma forma sofisticada, atraente e simples. Sabemos que a metálica resolve a forma arquitetônica e que para a estrutura ficar viável economicamente, tem que criar elementos repetitivos e construir de forma sistêmica.

Como é seu processo criativo durante um projeto de arquitetura?

Mario Biselli – O processo criativo é muito pessoal. Estou justamente abordando a questão da criatividade no meu doutorado. A essência da arquitetura é começar sem preconceito em um projeto. Tem coisas que obviamente já possuem uma configuração, por exemplo, um estádio precisa de campo e plateia. Você não vai repensar isso. Isso é uma configuração funcional rígida, imutável. Mas, mesmo assim, é possível colocar uma ideia. Quando a gente faz um projeto que dá certo, tende a repeti-lo e eu acho isso uma coisa que não é muito saudável em arquitetura. A solução arquitetônica vai aparecer dependendo das condições do que é dado, programa, terreno, cliente, essas configurações.

Biselli_aeroporto

Mário Biselli desenha e define a simplicidade da estrutura
metálica escolhida para terminal do aeroporto

Na sua atividade acadêmica como é tratada a criatividade?

Mario Biselli – Em primeiro lugar vem a educação da cultura arquitetônica, o senso estético é fundamental. Depois, cultura acumulada. O mais importante para a arquitetura é a cultura. E a atitude do arquiteto. Como ele se comporta profissionalmente e perante a vida. E o resto é incentivo à criatividade, porque o professor não tem como dizer: “Faz assim que esse é o certo”. Isto não existe. O que ele pode falar é: “Isso que você fez, já fizeram e não deu certo. Veja estes bons exemplos atuais. Vê se isso te serve de referência para dar um passo adiante”.

Segundo as estatísticas o uso das estruturas metálicas ainda é pequeno, está crescendo, mas ainda não é como se gostaria. Na sua opinião, a que se deve isso?

Mario Biselli – É uma forma cultural de pensar, uma falta de conhecimento dos materiais, e a história da construção no Brasil. O concreto ficou consolidado no País, por muitos anos, quando não tinha a siderurgia funcionando como agora. No Brasil tem abundância de mão de obra barata para fazer alvenaria. Assim criou-se uma tradição cultural de construir com concreto. O aço é uma questão recente. Não há ainda a cultura do aço. Eu sou daqueles que acha que está na hora de desenvolver uma linguagem própria para o aço no Brasil. Estou tentando trabalhar nisso e gosto do aço em especial. Além disso, tem que se pensar o projeto em famílias de raciocínio, o raciocínio construtivo. Por exemplo: aço, madeira e alumínio pertencem a uma família, e concreto é outra família. O concreto é modelagem. O aço, madeira e alumínio são estruturas baseadas em perfis e funcionam por tramas sobrepostas. Isso gera um raciocínio projetual totalmente diferente.

Você tem algumas experiências em projetos de habitação social, como você vê esta problemática no Brasil?

Mario Biselli – Em países como Espanha e a Holanda funciona muito bem. Aqui, a solução adotada pelos programas habitacionais de baixa renda criam um não-lugar. São todos prédios iguais uns aos outros, sem urbanidade. Não tem movimento na rua. O espaço público é de ninguém. Este problema é mais importante que o construtivo. A arrecadação do governo corresponde a 34% do PIB nacional, o que significa mais de 1 trilhão de reais. Estes são os números recentes do Impostódromo, exposto no centro de São Paulo. Mas o governo quer sempre resolver o problema de habitação no atacado. Ele conseguiu o dinheiro, solta a verba na mão das construtoras e saem fazendo não-lugares. E essas coisas não funcionam, depois dá degradação e violência urbana. A habitação social tem que estar no mesmo contexto da construção da cidade. O edifício tem de ser um construtor da cidade e do lugar. Não é uma habitação a ser feita, e sim, quadras inteiras. Sendo necessária a produção em escala, o aço, pelas suas características de rapidez e construção sistêmica, é a melhor opção.

Fotos: Camila Vinhas

Fonte: http://www.cbca-acobrasil.org.br/entrevistas-ler.php?cod=5417

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