Hoje, vale a pena ser arquiteto?

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Um arquiteto é uma pessoa que pode sempre sonhar, mesmo depois de 20, 30, 40 anos de carreira, acredita que pode surgir “aquele projeto”, a tal encomenda, aquele sonho de desenhar a obra mais bela que as pessoas já viram. E qualquer arquiteto aspira a projetar até ao fim dos seus dias. Um arquiteto, mesmo que esteja a fazer o que quer que seja, será sempre, sempre, arquiteto.


Segundo sei, esta semana saiu um ranking meio estúpido do ministério da educação. E saiu agorinha em julho para que a rapaziada jovem saiba quais são os cursos que dão emprego e quais os que têm mais gente inscrita no Centro de Emprego (ou será Centro do Desemprego?). Consta que nesse ranking os “piores” cursos são os de arquitetura, que lidera a lista, logo seguida da engenharia. Pois bem, a arquitetura, uma área de excelência em Portugal (em especial no Porto), referência em todo o mundo, pimba! Está em descrédito. Esfumou-se o sonho do jovem que admira o Siza Vieira, o Souto de Moura, a Hadid, o Koolhaas, etc. E estragou-se a admiração daquele rapazito que nas aulas de educação visual se apaixonou pela casa de linhas modernas que o professor do liceu, que é arquiteto, está a desenhar. Ou do outro que na telenovela viu um arquiteto “pintarolas”, cheio de classe e cultura. Agora habituaram-se a ouvir o pai, a mãe e o resto da família a contar a angústia do primo que é arquiteto e está desempregado, da filha do vizinho que é arquiteta e trabalha a vender apartamentos, dos outros que dizem que os arquitetos cá ganham mesmo mal e por isso emigraram para a Suíça, Inglaterra, África, Brasil, etc. Assim, neste estado de coisas, possuir um bacharelato em informática ou em análises clínicas é mais aliciante que sofrer cinco anos para ser arquiteto. Obter um título, mesmo que seja em administração pública e recursos humanos, em turismo, teologia ou línguas orientais é um caminho mais seguro e tendencialmente mais próspero do que ser arquiteto. Pois permitam-me que diga uma coisa aos pais, aos tios, aos consultores pedagógicos e a quem quiser ouvir: Não há memória de os livros de história falarem de uma profissão como falam dos arquitetos.
Há milhares e milhares de arquitetos que ficaram registados nos livros das gerações futuras, nas fotografias que se tiram nos centros históricos. Mesmo alguns mais anónimos. Quando viajamos e nos fotografamos junto a um conjunto de belo enquadramento em Itália, em França, na Alemanha ou em Inglaterra, por detrás daqueles edifícios está o nome e o trabalho dos arquitetos, uns mais conhecidos, outros menos, mas todos partilharam essa dádiva que foi deixarem a sua obra para lá da sua vida. O desemprego sempre teve uma relação próxima com a arquitetura. E sempre houve desemprego entre arquitetos. E sempre houve arquitetos a fazer outras coisas para sobreviver. Mas mesmo com isso continua a estar apto a cumprir o seu sonho de desenhar uma casa como fazia o seu professor do liceu. Nem que seja ao fim de semana ou em cima da mesa de jantar à noite. Existem muitos arquitetos, que poucas obras construíram na vida. Alguns quase nenhumas. E mesmo assim estão na memória.
Por isso um arquiteto é uma pessoa que pode sempre sonhar, mesmo depois de 20, 30, 40 anos de carreira, acredita que pode surgir “aquele projeto”, a tal encomenda, aquele sonho de desenhar a obra mais bela que as pessoas já viram. E qualquer arquiteto aspira a projetar até ao fim dos seus dias. Um arquiteto, mesmo que esteja a fazer o que quer que seja, será sempre, sempre, arquiteto. Ser arquiteto não é só uma profissão, é pertencer à classe das coisas únicas no mundo que tocam os nossos sentimentos. E gostar de arquitetura é também um ato de amor à humanidade. Por isso digo aos que querem ser arquitetos e ouvem os conselhos dos que vos demovem da intenção – NÃO DESISTAM! Porque podem não só estar a ouvir um mau conselho, como também a destruir o vosso sonho. E se me perguntarem por que vale a pena ser arquiteto hoje? Sempre valeu e houve alturas piores.
Imagem de perfil de Avelino Oliveira
Avelino Oliveira nasceu no Porto, em 1970. Estudou Arquitetura na U. Porto (até 1995) e em Inglaterra, onde foi bolseiro. Estagiou na C.M.Porto e ingressou como técnico na C.M.Vila do Conde. Ainda como estudante fundou a Oval, empresa em que apostou as suas energias e que se mantém até hoje. De 1999 a 2004, dividiu a sua atividade entre a produção de arquitetura, a docência no curso de arquitetura da U.F.Pessoa e os Estudos Pós-Graduados na UPC em Barcelona. Doutorou-se em 2012 e desde dezembro de 2013 exerce funções de Secretário da Comissão Executiva da Área Metropolitana do Porto. É membro do conselho científico de revistas internacionais em Portugal, Brasil e Letónia. É também Investigador-colaborador do CAPP – Centro de Investigação do ISCSP. Como arquiteto possui obra construída em Portugal e publicada em vários países.

Fonte: http://www.porto24.pt/opiniao/hoje-vale-pena-ser-arquiteto/

1 comentários:

Unknown on 4 de agosto de 2015 às 23:14 disse...

Resumindo. Vale muito a pena.

 
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