Tecnologia: Especial Fachadas

EM POUCO MAIS DE DEZ ANOS, DESDE A PRIMEIRA OBRA COM FACHADAS UNITIZADAS, O SETOR VEM SE ESTRUTURANDO PARA PRODUZIR E INSTALAR MÓDULOS DO SISTEMA. A PERGUNTA QUE SE FAZ AGORA É SE TODOS ESTÃO REALMENTE PREPARADOS. PARA BUSCAR RESPOSTAS, FINESTRA ENTREVISTOU PROFISSIONAIS ENVOLVIDOS EM TODA A CADEIA PRODUTIVA. O RESULTADO ESTÁ NESTA E NAS PÁGINAS SEGUINTES.

A arquitetura vertical está recheada de faces assimétricas, com diferentes planos na mesma fachada, extremidades com nichos, perfis ornamentais e abas projetadas como empenas espaciais. Hoje é muito maior a exigência por grandes vãos e ângulos, tanto na horizontal como na vertical. Em decorrência disso, as espessuras de vidro aumentam, tendo por consequência maior solicitação da ancoragem e dos sistemas de vedação ao ar, à água e acústico. “Projetos com esses conceitos, turbinados por cronogramas desafiadores, têm nos ensejado a absorver variáveis antes inimagináveis entre a fachada de alumínio e vidro e a estrutura de concreto”, afirma Arimateia Nonatto, gerente de Engenharia & Produtos da Belmetal.
Do ponto de vista técnico, além do fato de o fabricante de fachadas ter absorvido o modo de trabalho com o unitizado, vieram detalhes de extrema importância para a construção, como a ancoragem com regulagem vertical, o prolongamento da ancoragem com regulagem horizontal e a coluna interna auxiliar. Soluções como  essas, desenvolvidas pela empresa de consultoria AC&D, em parceria com a Alcoa, são exemplos de como o setor tem investido em tecnologia. Segundo o consultor Antônio B. Cardoso, da AC&D, essa postura envolve diretamente profissionais de toda a cadeia produtiva - de projetistas e fabricantes de fachadas às construtoras -, sempre exigindo um movimento de aprendizado, sob o ponto de vista de cultura, educação, treinamento e ensaios.
Trata-se, portanto, de um cenário de crescente adequação das empresas para atender à demanda. Mas será que em pouco mais de dez anos, desde que o sistema unitizado foi introduzido no Brasil, todos estão preparados? Para  o engenheiro Crescêncio Petrucci Júnior, da Petrucci Consultoria e Engenharia, de São Paulo, a etapa de projeto e fabricação dos módulos, em grande parte das companhias, já passou por um período evolutivo e está bem ajustada às necessidades de cada empreendimento. Porém, a logística, em que se define o plano de execução e de instalação dos módulos, ainda está muito aquém, principalmente devido à falta de capacitação profissional. Ele  observa que há grande disparidade da estrutura técnica entre as empresas que atuam nesse segmento. Enquanto nos grandes centros a maior parte delas já está estruturada, em outras regiões do país a maioria não possui aparato mínimo para executar fachadas com essa tecnologia.
“Mas apenas boa estrutura não garante bons resultados. Isso porque a etapa mais frágil e menos evoluída está associada à instalação dos módulos”, diz Petrucci. “Vemos empresas sem nenhuma estrutura e algumas com estrutura muito moderna e de grande projeção no mercado cometendo erros primários. Estas têm conhecimento técnico, acesso a informações, sejam elas de sistemistas, normas, consultores, projetistas etc., porém não possuem a capacidade de transmitir aos seus subordinados, tampouco fazer controle de qualidade dos serviços executados”, observa ele.
“Os fabricantes de sistema unitizado estão concentrados em São Paulo, em sua maioria, além de mais uns dois ou três no resto do país. Eles devem desenvolver mais a logística, pois falta tecnologia na movimentação e içamento em obra e esse é um grande entrave no incremento » do sistema unitizado”, afirma Délcio Eustáquio Braga, diretor da BM Consultoria, de Belo Horizonte. “Fora  dos grandes centros urbanos não verificamos a presença de muitos fabricantes preparados para atender à demanda. A  elaboração de uma fachada unitizada envolve capacidade técnica produtiva com investimentos em tecnologia e mão de obra qualificada”, completa a consultora Maria Teresa F. Godoy, da Arqmate, de São Paulo.
“Há cinco anos contabilizamos 21 empresas preparadas para a produção de fachadas unitizadas. Hoje este número chega a mais de 70, considerando aquelas com equipamentos como centros de usinagem de perfis e até com CNCs para usinagem de ACM”, observa  Nonatto. Segundo ele, boa parte dessas empresas opera suas máquinas com software de gestão de produção. Nesse contexto também estão inclusas companhias internacionais. Portanto, há um movimento crescente na busca por capacitação nesse tipo de produto.
O arquiteto e consultor Paulo César de Oliveira, da Santa Clara Consultoria em Esquadrias, de Brasília, considera também um desafio o trabalho de convencimento do cliente/construtor quanto ao sistema unitizado. “Para  alguns ainda é novidade, além de o custo ser maior do que o do sistema tradicional”, diz ele. “Para  a maioria dos fabricantes é necessário que se faça uma apresentação do sistema, com a logística de instalação, o que exigirá treinamento da equipe junto ao sistemista.” Na etapa de planejamento de implantação do sistema no canteiro de obra, o construtor e o fabricante deverão estar sintonizados.
FORMAÇÃO
“Não podemos ter a ideia de que fazer uma fachada é para principiantes ou empresas sem preparo e treinamento. Nos últimos tempos temos visto alguns absurdos nas áreas de fachada e estes ocorrem por total desconhecimento de como as mesmas funcionam”, afirma o consultor Igor Alvim, da QMD Consultoria, do Rio de Janeiro. Em sua opinião, a criação de um programa para habilitar os fabricantes à execução de fachadas unitizadas seria um bom começo. “Considerando todas as regiões do país onde o sistema vem sendo instalado, os fabricantes não estão preparados para atender à demanda”, ele avalia.
“No que tange a equipamentos até que evoluímos bastante, mas não adianta ter equipamentos se os princípios básicos de uma fachada não são entendidos”, diz Alvim, observando que as empresas sistemistas deveriam investir em programas de capacitação para os fabricantes de fachadas unitizadas. A consultora Tatiana Domingues, da Paulo Duarte Consultores, dá uma sugestão: “O curso oferecido pelo Senai para desenhista de esquadrias poderia incrementar um nível superior, no qual fosse abordado somente esse tipo de sistema, que teve uma demanda muito grande nos últimos cinco anos, com particularidades de projeto muitas vezes desconhecidas pelos desenhistas recém-formados”. 
“Algumas empresas no exterior, que atuam nesse segmento, promovem a capacitação de seus funcionários através de cursos e seminários dentro da própria empresa”, diz Petrucci. Essa  capacitação é feita de acordo com a função que o profissional irá desempenhar. Ou seja, se ele for atuar na área de projeto, fabricação ou instalação de fachada, o direcionamento do curso é específico e o profissional só começa a trabalhar e assumir suas funções depois que passa pela formação que a empresa fornece.
“A fabricação e a instalação de uma fachada unitizada vêm se tornando cada vez mais simples, e muitos fabricantes têm optado por trabalhar exclusivamente com esse sistema considerando os benefícios proporcionados em termos de simplicidade de execução, rapidez na instalação e garantia de alto desempenho. Havendo planejamento e a garantia de que o cronograma de fabricação e instalação da fachada seja alinhado com a obra, o que hoje se vê como complexo é tranquilamente solucionado com a equipe treinada e com os equipamentos adequados em mãos”, acrescenta Luiz Nitschke, gerente de negócios Kawneer da Alcoa. Na sua opinião, “a perfeita execução de uma fachada-cortina, de qualquer tipo, só acontece quando as pessoas envolvidas desde a etapa de projeto, levantamento de materiais, fabricação e instalação estão devidamente capacitadas”.
EVOLUÇÃO TECNOLÓGICA  
O período de 2000 a 2014 foi o mais brilhante da história das esquadrias no Brasil, pois mostrou o alinhamento do setor com relação aos países desenvolvidos e em particular no segmento das fachadas, em função do sistema unitizado. “Mas ainda temos muito a fazer em termos de pesquisa, infraestrutura e preparação de mão de obra”, afirma Antônio B. Cardoso, da AC&D Consultores. Ele acompanhou os primeiros passos da chegada desse sistema ao Brasil e também o desenvolvimento da linha Unit, da Alcoa, nas instalações da Kawneer, em Atlanta, nos Estados Unidos, no início dos anos 2000.
A abertura do mercado brasileiro para a importação de máquinas e equipamentos, na década de 1990, foi o ponto de partida para que o setor de esquadrias começasse sua evolução. A Afeal se fortaleceu e empresários como Roberto Papaiz, na época à frente da Udinese e hoje diretor da EuroCentro, passaram a incentivar a ida de fabricantes a países europeus, principalmente a Itália, para conhecer o modo de produção local. Nos anos seguintes, empresas que hoje se destacam no setor começaram a comprar equipamentos, centros de usinagem com a introdução do comando numérico computadorizado (CNC), que tornou mais precisa a usinagem de perfis de alta complexidade. Foi o início da cultura da qualidade na fabricação das esquadrias, disseminada pela revista FINESTRA, que em 1995 publicou sua primeira edição.
O conceito do sistema unitizado - em que a fachada é construída com módulos - surgiu nos Estados Unidos, onde também é chamado de envelopamento. Chegou ao Brasil em 2002 através da Kawneer, uma subsidiária da Alcoa, para compor as fachadas do BankBoston, projeto do grupo SOM e Escritório Técnico Júlio Neves. 
Depois vieram outras obras que absorveram a evolução do sistema, como a do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, que teve um dos maiores módulos unitizados (4.060 x 5.240 milímetros), ou ainda edificações com vidro duplo e persianas integradas, ou revestimentos em pedra juntamente com a colagem do vidro.
Antes, as fachadas eram montadas com o sistema stick, com colunas, travessas e quadros com vidro, sempre pelo lado externo, com o uso de balancins. Com o sistema unitizado, o painel em forma de módulo passou a desempenhar o papel de colunas, travessas e quadros com vidro, sendo que a altura do módulo alcança o pé-direito do andar-tipo, fechando, portanto, todo o vão. Outra inovação é que a montagem passou a ser feita sem balancins, pelo lado interno da obra, com mais segurança para os trabalhadores.







QUESTÃO DOS VIDROS
Responsável por vedar os vãos, porém mantendo a transparência e o conforto termoacústico do edifício, o vidro acompanhou o desenvolvimento tecnológico do setor de caixilhos. Hoje a indústria produz vidros de elevado desempenho de acordo com normas técnicas (leia FINESTRA  76). O desempenho energético inicial da solução de vidro, por exemplo, é informado através de simulação da configuração solicitada em software, segundo a arquiteta Cláudia Mitne, diretora de marketing da GlassecViracon, empresa que desenvolve estudos, especificação e beneficiamento de vidros para fachadas.
Para muitas obras, a confirmação do desempenho, antes do fechamento do fornecimento, é um requisito. Nesse caso, segundo Cláudia, há um laboratório independente no Brasil - o Centro Técnico de Elaboração do Vidro (Cetev), do grupo Verallia - que faz o ensaio de desempenho energético. Ela  informa que a GlassecViracon tem um laboratório próprio na planta, para medição espectrométrica do vidro, a fim de garantir os requisitos luminosos e a homogeneidade de cor do produto fornecido.
Os vidros duplos insulados são produzidos com duas selagens: a primeira com butil, para garantir a estanqueidade dentro da câmara, e a segunda com silicone estrutural, que deve ser compatível com o silicone a ser aplicado na colagem do vidro ao quadro, explica Cláudia. Para a frente de laje, os sistemas unitizados que utilizam vidros de controle solar têm duas opções: vidros com alta reflexão e baixa absorção são instalados sem shadow box; já vidros com alta transmissão luminosa e baixa absorção são aplicados com shadow box para harmonização visual entre vão-luz e frente de viga. “O  desempenho do item absorção deve sempre ser observado; se muito elevado, o vidro deve ser tratado termicamente a fim de garantir a resistência mecânica e evitar o estresse térmico”, explica ela.
Para a beneficiadora dos vidros, a maior complexidade para a construção de uma fachada unitizada está relacionada ao cumprimento do cronograma de entrega acordado entre a obra, o sistemista e o caixilheiro. “De  nossa parte, temos cuidados com o planejamento interno da disponibilidade de matéria-prima, da programação de produção por lotes de prioridades e principalmente com a entrega - o lote deve ser entregue completo para atender à instalação unitizada”, afirma a diretora da GlassecViracon.


Texto de Cida Paiva| Publicada originalmente em Finestra na Edição 93Fonte: http://www.arcoweb.com.br/finestra/tecnologia/tecnologia-que-falta-para-consolidar-sistema-unitizado

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