Trabalhar no exterior: vale a pena?

Por Juliana Nakamura

Edição 222 - Setembro/2012

Incrementar o currículo com uma experiência no exterior, principalmente em um escritório renomado, é o sonho de muitos jovens arquitetos. Afinal, isso pode significar a oportunidade de atuar em grandes projetos, de conhecer profissionais de outros países e de ter contato com métodos de trabalho diferentes. Sem contar a bagagem cultural e pessoal que a vivência em outro país proporciona.

"Os desafios são enormes, mas vale muito a pena", resume a arquiteta Daniela Getlinger, que trabalhou no Morphosis, escritório do vencedor do Prêmio Pritzker de 2005, Thom Mayne, na Califórnia. A opinião é compartilhada por Leonardo Shieh, que durante dois anos integrou a equipe de Rafael Viñoly em Nova York. "Foi uma experiência intensa e diversificada, diretamente proporcional ao apetite que tinha por trabalhar e aprender. Foram dois anos que valeram por quatro", conta o arquiteto, que após esse período emendou curso de mestrado no Massachusetts Institute of Technology (MIT), também nos Estados Unidos.

PRIMEIROS CONTATOS
Leonardo revela que, logo que se formou no Brasil, montou um portfólio e foi mochilar nos Estados Unidos e Europa. "Tentava agendar visitas nos escritórios que mais me interessavam. Foi assim que conheci o diretor do escritório do Viñoly", lembra. Já a arquiteta Assunta Viola, por não encontrar emprego no Brasil, embarcou para a Itália aos 28 anos, com três anos de experiência em paisagismo na bagagem. "Fiz muitas entrevistas em Roma antes de conseguir trabalho no escritório do Massimiliano Fuksas, onde pude participar das fases de elaboração dos projetos e, posteriormente, no desenvolvimento dos projetos executivos", conta a arquiteta, que atuou por quatro anos no escritório do italiano, parte do tempo em Roma, parte no estúdio de Paris.

OUTROS MEIOS
Conseguir uma vaga de trabalho no exterior não é fácil. Principalmente para quem quer fazê-lo ainda no Brasil, por redes sociais ou sites de emprego, ou ainda enviando currículos para os escritórios de arquitetura internacionais de interesse. Apesar de difícil, nada impede que um candidato impressione o selecionador em uma entrevista de emprego via Skype e consiga a vaga.

Candidatar-se a bolsas em cursos de mestrado pode ser outro meio de ingressar no exterior profissionalmente, segundo Daniela Getlinger. Do Brasil, ela se candidatou a vagas em três universidades norte-americanas. Foi aceita em duas e escolheu a Universidade da Califórnia (Ucla) por questões financeiras e pela oportunidade de vivenciar de perto a produção de dois arquitetos que admira: Frank Ghery e Thom Maine. A arquiteta, que inicialmente viajou com visto de estudante, trabalhou para a Morphosis ainda na faculdade. Logo que terminou o curso, foi contratada por outro escritório de arquitetura de Los Angeles, alterando o seu visto de permanência.

MUDANÇA E ADAPTAÇÃO
Ao emigrar, o profissional precisa estar preparado para se adaptar a novas formas de viver e de trabalhar. Daniela conta que, nos Estados Unidos, o arquiteto tem de se virar sem apoio de secretária, office boy ou estagiário. Além disso, o ritmo de trabalho, o profissionalismo e a competição são elevados. No primeiro ano de contrato, o trabalhador tem direito a uma semana de férias e cinco feriados. É normal não fazer hora de almoço e é esperado que o profissional faça horas extras e se dedique integralmente.

Leonardo levou cerca de dois meses para se acostumar com o novo contexto de trabalho, principalmente com o vocabulário técnico e a grande escala dos projetos, que exigia interagir com uma grande equipe, entre arquitetos e consultores externos. "Também senti dificuldade com o sistema imperial de medidas. É incrível como nossa mente está condicionada ao centímetro e metro", revela.

Até começar a receber em moeda local, o profissional pode ter que abrir mão de algum conforto e precisar de reserva financeira para manter-se em outro país. "Dividia apartamento com outras duas pessoas e vivia sem luxos", conta o arquiteto. Já Assunta ficou hospedada na casa dos parentes italianos nos seis primeiros meses. "Quando passei a ser remunerada como uma arquiteta europeia, pude pagar meu aluguel e minhas despesas."

NA BAGAGEM
Para Assunta, a experiência ensinou a deixar a fantasia de lado na hora de trabalhar. "Entendi que não há projetos glamorosos. Há sempre muito e intenso trabalho", diz a arquiteta. Ela conta que, na Europa, as licitações são sempre feitas por escolha de projetos e não de preços. "Tudo isso faz com que a obra, inclusive em relação à arquitetura, tenha uma qualidade diferente em comparação ao que acontece no Brasil", analisa.

Já Leonardo, que participou de toda a etapa de detalhamento do projeto executivo do Instituto de Nanociência da Universidade da Califórnia e da proposta para o novo World Trade Center, conta que aprendeu a lidar com projetos complexos trabalhando com Viñoly. "Sempre buscávamos articulações que pudessem resolver um extenso programa de forma lógica. Acho que isso me ajudou a ganhar o concurso para um intrincado centro médico em São Paulo", revela o arquiteto.

DE VOLTA ÀS ORIGENS
Embora enriqueça o currículo, o fato de ter trabalhado fora nem sempre garante boas oportunidades de emprego no Brasil. "Cheguei a ouvir em entrevistas que eu era muito qualificada para a média do mercado, que experiência na Europa não queria dizer nada", revela Assunta, que após quatro anos no exterior prestou concurso público na CDHU. Depois disso, seguiu carreira acadêmica e passou a desenvolver projetos em escritório próprio.

O retorno ao Brasil pode exigir um novo esforço de adaptação. "Você se acostuma com o extremo profissionalismo e, quando chega aqui, precisa compreender como a cultura do jeitinho está interiorizada em todas as relações", diz Daniela, para quem, ainda assim, a experiência é valiosa. "Hoje tenho uma capacidade de organização que aprendi lá. Também conquistei trabalhos no Brasil muito em função de possuir inglês técnico e por transitar bem nos dois sistemas métricos", finaliza.

Sergio Colotto

Do Brasil para o mundo
● Prepare um portfólio digital com links de arquivos ou vídeos que possam ser acessados durante a entrevista via Skype
● Antes de escolher o local de destino, estabeleça contato com arquitetos radicados no país por redes sociais e se informe sobre o ambiente de trabalho
● Com ou sem emprego garantido, avalie o custo de vida do local e poupe para a sua estadia no exterior antes de viajar
● Verifique a documentação e os pré-requisitos exigidos para um arquiteto estrangeiro atuar no país-alvo. Só embarque legalizado, com visto adequado ao que você pretende fazer
● Mantenha contato no Brasil. Afinal, você irá precisar de contatos na volta pra casa

Fonte: http://au.pini.com.br/arquitetura-urbanismo/222/trabalhar-no-exterior-vale-a-pena-266310-1.aspx

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